sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

O Pai Natal da Rádio

Em Penafiel, a rádio local tinha por tradição, na noite de 24 para 25 de Dezembro, colocar dois personagens vestidos de Pai Natal, cheios de presentes, que iam distribuir a quem ligasse para a estação.

Estávamos em finais da década de 80, inícios da de 90, do séc. XX. Na altura, o mundo digital ainda estava na incubadora… Não há registos do que, então, se vivia. Apenas o relato do pivô da emissão de um desses natais, em que participou activamente um dos membros de Hiperlugar como… Pai Natal! Na altura, era jornalista na Rádio Clube de Penafiel.

Uma história de um Pai Natal, literalmente na primeira pessoa, aqui contada por José Vinha (o então pivô), jornalista, colaborador do “Jornal de Notícias”:


O Pai Natal existe

Mal o relógio do estúdio cantou a meia-noite, começou a chuva de telefonemas. Parecia que em cada casa havia uma rádio acesa, na noite da consoada! Ao contrário, não havia um telefone em cada lar. Nem telemóveis. Lembro-me de ouvir muita criança dizer que falava para a rádio através de uma cabina telefónica pública. Ligavam umas atrás de outras, entupiam o canal, numa tremenda ansiedade, para pedirem uma prenda ao Pai Natal. Mas, também, havia gente à porta do estúdio. Eram pessoas com bolo-rei e garrafas de vinho, animadas, dispostas a acompanhar ao vivo, pela madrugada fora, aquela emissão radiofónica.

Em cima da hora, o Vítor de Sousa enfiou, apressadamente, o fato de Pai Natal, demasiado apertado para a poderosa barriga cheia de generosidade. Estava pronto a assumir o papel do “Pai Natal Novo”. Ao lado dele, o Lobo Baptista esticava-se dentro de outra farda e colocava a barba para se transformar no “Pai Natal Velho”.

A mim cabia o papel de “pivot” da emissão, alimentando ilusões aos pequenos ouvintes, à espera de falarem com os dois pais Natal. O Vítor respondia-lhes com “Urra… urra…” galhofeiro, enquanto o Baptista, num rufo, prometia brindes e consolos.

Os restantes rapazes da rádio esperavam nos automóveis, estes transformados radiofonicamente em renas mitológicas e prontos a percorrer a vasta região do Vale do Sousa e Baixo Tâmega.

Ao longo da madrugada, os dois Pais Natal desbravaram estradas, percorreram quilómetros e quilómetros, levando presentes aos ouvintes contemplados. A madrugada era mágica.

A noite voava, agitava-se inteiriça, recheada de aventuras. Que o diga o Vítor de Sousa quando, por volta das três da manhã - e por engano - se abeirou da casa de um caçador em Rio de Moinhos, Penafiel. Ia rigorosamente trajado de Pai Natal com o saco das prendas às costas. Os cães ladraram e alertaram o proprietário para a presença daquele intruso. De caçadeira em riste, o caçador abeirou-se da estranha figura. Não queria acreditar no que via: o Pai Natal de braços erguidos a pedir-lhe por todos os santos para que baixasse a arma!

O susto passou com risadas, mas aquele caçador ainda hoje há-de jurar a pés juntos que o Pai Natal existe mesmo; e só por milagre não o baleou. A pouco metros dali, numa casa ao lado, toda a família estava acordada à espera deste Pai Natal, que para lá se deslocou. Ia borrado de medo e atrapalhado, incapaz de descortinar qual era a prenda a entregar, de tal modo que ofereceu uma boneca a um rapaz, para desconsolo do premiado.
José Vinha